sábado, 9 de abril de 2011

Fernando António Nogueira Pessoa (Lisboa, 13 de Junho de 1888 — Lisboa, 30 de Novembro de 1935), mais conhecido como Fernando Pessoa, foi um poeta e escritor português.
É considerado um dos maiores poetas da Língua Portuguesa, e da Literatura Universal, muitas vezes comparado com Luís de Camões. O crítico literário Harold Bloom considerou a sua obra um "legado da língua portuguesa ao mundo".
Por ter crescido na África do Sul, para onde foi aos sete anos em virtude do casamento de sua mãe, Pessoa aprendeu a língua inglesa. Das quatro obras que publicou em vida, três são na língua inglesa. Fernando Pessoa dedicou-se também a traduções desse idioma.
Ao longo da vida trabalhou em várias firmas como correspondente comercial. Foi também empresário, editor, crítico literário, activista político, tradutor, jornalista, inventor, publicitário e publicista, ao mesmo tempo que produzia a sua obra liter. Como poeta, desdobrou-se em múltiplas personalidades conhecidas como heterónimos, objecto da maior parte dos estudos sobre sua vida e sua obra. Centro irradiador da heteronímia, auto-denominou-se um "drama em gente".
Fernando Pessoa morreu de cirrose hepática aos 47 anos, na cidade onde nasceu. Sua última frase foi escrita em Inglês: "I know not what tomorrow will bring… " ("Não sei o que o amanhã trará").

quinta-feira, 7 de abril de 2011

A Astrologia segundo Pessoa






           Segundo Gaspar Simões, o poeta da Mensagem chegou a admitir a hipótese de se dedicar, profissionalmente, à astrologia - "ciência que cultivou com proficiência" e que talvez lhe tivesse permitido ganhar mais do que como tradutor, condição em que subsistiu.
               Paulo Cardoso, astrólogo e pintor, vai mas longe ao esclarecer que no espólio literário de Fernando Pessoa há cálculos e notas astrológicas desde 1908, observando que a astrologia foi, desde cedo, "a fórmula que respondia assiduamente às dúvidas que se lhe colocavam acerca da sua sincronia com a vida, ou com o mundo: no espólio existem variadíssimos cálculos astrológicos relativos às diferentes áreas da existência - dinheiro, afetividade, etc.- feitos muitos deles em diversos momentos do mesmo dia." E acrescenta Paulo Cardoso, no estudo Mar Portuguez / a mensagem astrológica da Mensagem: "A importância da presença capital da astrologia na vida de Fernando Pessoa vai sem dúvida dirigir-se ao mundo da heteronímia. Aqui, ela, a astrologia, será o suporte técnico indispensável, a estrutura básica onde assentará o edifício - pirâmide de quatro lados - que o irá albergar conjuntamente com os seus 'companheiros de espírito'. A astrologia funcionará como filosofia essencial de apoio ao rigoroso projeto de arquitetura heteronímica que lhe permitirá descrever com profundidade, minúcia e exatidão, tanto a vida como personalidade e, inclusivamente, o aspecto físico de cada um dos seus três heterônimos."

              Não apenas três, mas muitos mais - a pesquisadora e ensaísta Teresa Rita Lopes já identificou, documentalmente, cerca de 70. E precisamente um deles é astrológo, apesar de pouco conhecido, "Raphael Baldaya", que seria provavelmente "o chefe" do escritório astrológico projeto, mas que não chegou a funcionar, onde se propunha desenvolver três modelos horoscópicos, ao que se deduz de uma circular publicitária:
                1 - "Horóscopo de experiência: 500 réis. (Breve resumo e ligeiras considerações sobre o teor gerla da vida.)
                   2 - "Horóspoco completo, contendo uma leitura detalhada da vida e da sorte: 2.500 réis.
                   3 - "Horóscopo detalhado: 5.000 réis."

                Além dos dois volumes já publicados sobre o Mar Portuguez de Fernando Pessoa (um em torno de "a mensagem astrológica da Mensagem", e o outro, abordando "a simbólica da Torre de Belém"), Paulo Cardoso projeta a organização de mais 3 volumes. Até lá, vários textos, assinados ou não por Raphael Baldaya, foram já divulgados, salientando-se do Tratado de Astrologia e seguinte definição pessoana: "O horóspoco não relata o que há antes do nascimento, nem o que há depois da morte, embora se possa admitir que aspectos (direções) em retrocesso, e em sucessão da morte, possam indicar certos fenômenos externos relativos à vida, por assim dizer pré-natal e pós-mortal do indivíduo. Isto, porém, é duvidoso." Etc.

                Anota-se que os vários biógrafos de Fernando Pessoa nunca aprofundaram os textos astrológicos do escritor-candidato a astrólogo nem tão pouco os interpretaram, limitando-se quase sempre a enunciá-los por alto. Paulo Cardoso, é uma das raras excepções e, após os dois já citados livros, aguarda-se que a publicação dos outros 3 já anunciados (mapas astrais e outros textos) venha a contribuir para o esclarecimenteo seguro do ocultismo que o poeta da Mensagem desenvolveu através da astrologia, que "é a arte da relação, a inter-relação, da interação", visto que "procura a unidade, promove o encontro harmônico entre o homem no seu todo, e deste com o Universo" - explica Paulo Cardoso. 

               É que segundo o estudioso da astrologia pessoana foi graças à Astrologia que Fernando Pessoa achou a ferramenta que buscava e que lhe deu (ao Poeta) "a possibilidade de elaborar um mais bem determinado percurso interior, uma criação mais orientada da sua Obra, e uma mais perfeita arquitetura para a realização da sua missão."

              
           

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Fernando Pessoa e a Maçonaria

            Na autobiografia que redigiu com data de 30/3/1935 e que veio a ser publicada como introdução ao poema À memória do Presidente-Rei Sidônio Pais, em 1940, declarava-se "liberal dentro do conservantismo, e absolutamente anti-reacionário", bem como a favor da Monarquia (mas considerava o sistema "inviável" em Portugal, no tempo, pelo que na hipótese de um plebiscito votaria a favor da República). Confessava-se ainda "cristão gnóstico", mas oposto às Igrejas organizadas: "Fiel, por motivos que mais adiante estão implícitos, à Tradição Secreta do Cristianismo, que tem íntimas relações com a Tradição Secreta em Israel (a Santa Kabbalah) e com a essência oculta da Maçonaria." Deixava em branco as informações sobre a sua "posição iniciática" e, politicamente, declarava-se "nacionalista que se guia por este lema: 'Tudo pela humanidade, nada contra a nação'." A posição social era a de "anti-comunista e anti-socialista", resumindo em três linhas todas as posições enunciadas: "Ter sempre em memória o mártir Jacques de Molay, Grã-Mestre dos Templários, e combater, sempre e em toda a parte, os seus três assassinos - a Ignorância, o Fanatismo e a Tirania."

            Somente em 1985, na exposição "Fernando Pessoa - O Último Ano", realizada na Biblioteca Nacional de Lisboa, foram divulgadas as 3 linhas da "poisção iniciática": "Iniciado, por comunicação direta de Mestre a Discípulo, nos três graus menores da (aparentemente extinta) Ordem Templária de Portugal".

            Mas de que iniciação se trata? No artigo que publicou no Diário de Lisboa 4/12/1935 sobre as associações secretas, visando em particular a Maçonaria, cujas atividades foram proibidas pelo governo de Oliveira Salazar, afirmava Fernando Pessoa: "(...) Não sou maçom, nem pertenço a qualquer ordem Ordem semelhante ou diferente. Não sou porém anti-maçom, pois o que sei do assunto me leva a ter uma idéia absolutamente favorável da Ordem Maçônica. A estas duas circunstâncias, que de certo modo me habilitam a poder ser imparcial na matéria, acresce a de que, por virtude de certos estudos meus, cuja natureza confina com a parte oculta da Maçonaria - parte que nada tem de político ou social -, fui necessariamente levado a estudar também esse assunto - assunto muito belo, mas muito difícil, sobretudo para quem o estuda de fora."

            Prosseguindo, esclarecia o estudioso dos problemas do Ocultismo: "A Ordem Maçônica é secreta por uma razão indireta e derivada - a mesma razão por que eram secretos os Mistérios antigos, incluindo os dos cristãos, que se reuniam em segredo, para louvar a Deus, em o que hoje também se chamariam Lojas ou Capítulos, e que, para se distinguir dos profanos, tinham fórmulas de reconhecimento - toque, ou palavras de passe, ou o que quer que fosse. Por esse motivo os romanos lhes chamavam ateus, inimigos da sociedade e inimigos do Império - precisamente os mesmos termos com que hoje os maçons são brindados pelos sequazes da Igreja Romana, filha, talvez ilegítima, daquela maçonaria remota."

             Este artigo provocou uma série de comentários na imprensa portuguesa da época, além de dois opúsculos, um deles por inciativa do Grêmio Lusitano de Lisboa (maçônica), enquanto o outro suprime algumas passagens do artigo inicial e acrescenta outros comentários, não assinados.

Prefácio de A Voz do Silêncio de Helena Blavatsky com tradução de Fernando Pessoa, Editora Ground

            Fernando Pessoa é, por excelência, o poeta do transcendentalismo. Sua poesia pode ser igualada à de William Blake. É densa, atingindo zonas do inconsciente, só reveladas aos místicos, aos profetas. Essa gradativa abertura de consciência, a camada cada vez mais profunda do Ser, transformou-o numa verdadeira ilha na língua portuguesa. Sucessivos estudos foram feitos sobre sua personalidade polimórfica. Mas, para se entender a essência de sua obra, temos de examiná-la sob o ângulo do Ocultismo. Fernando Pessoa dominava enorme série de conhecimentos que os homens, ditos educados, repudiam como sinal de ignorância e superstição. Como Gustav Jung, era um pesquisador do oculto. Um Mestre no que dizia respeito a Alquimia, Astrologia, Rosa-Crucianismo, Kabala, Maçonaria, Magia, etc. Sentia-se atraído por elas como por um abismo...

                                                                                                                     Murilo Nunes de Azevedo

                                          

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Fernando Pessoa, do espiritismo à Teosofia

           O encontro com a teosofia é posterior às experiências espíritas, de que teria participado "algumas vezes, incrédulo" (segundo Gaspar Simões); "Durante os anos que vivera com a tia Anica (Ana Luísa Nogueira de Freitas) tivera a ocasião de ser industriado pela boa senhora nos segredos do espiritismo. Pelo contrário, parece que, incrédulo, quando assistia às sessões 'semi-espíritas' que por essa altura se realizavam (...), constituía um obstáculo ao bom êxito dessas sessões" - comenta o biógrafo. E há uma carta (de 24/06/1916) em que Fernando Pessoa relata à Tia Anica, carta que documenta o pensamento do então jovem de 28 anos a respeito do espiritismo: 
           
           "(...) Aí por fins de março (se não me engano) comecei a ser médium. Imagine! Eu, que (como deve recordar-se) era um elemento atrasador nas sessões semi-espíritas que fazíamos, comecei, de repente, com a escrita automática. Estava uma vez em casa de noite, (...) quando senti a vontade de, literalmente, pegar numa pena e pô-la sobre o papel. É claro que depois é que dei por o fato de que tinha tido esse impulso. (...) Nessa primeira sessão comecei por a assinatura (tão bem conhecida de mim) "Manuel Gualdino da Cunha".

           "(...) De vez em quando, umas vezes voluntariamente, outras obrigado, escrevo. Mas raras vezes são 'comunicações' compreensíveis. Certas frases percebem-se. E há sobretudo uma cousa curiosíssima - uma tendência irritante para me responder a perguntas com números; assim como há a tendência para desenhar. Não são desenhos de cousas, mas de sinais cabalísticos e maçônicos, símbolos de ocultismo e cousas assim que me pertubam um pouco. (...) Devo dizer que o pretenso espírito do tio Cunha nunca mais se manifestou pela escrita (nem de outra maneira). As comunicações atuais são, por assim dizer, anônimas e sempre que pergunto 'quem é que fala?' faz-me desenhos ou escreve-me números.

            "(...) Guardo, porém, para  o fim o detalhe mais interessante. É que estou desenvolvendo qualidades não só de médium escrevente, mas também de médium vidente. Começo a ter aquilo a que os ocultistas chamam 'a visão astral', e também a chamada 'visão etérica'. Tudo está muito em princípio, mas não admite dúvidas. É tudo, por enquanto, imperfeito e em certos momentos só, mas neste momento não existe.(...) Há momentos, por exemplo, em que tenho perfeitamente alvoradas (?) de 'visão etérica' - em que vejo a 'aura magnética' de algumas pessoas, e sobretudo, a minha ao espelho e, no escuro, irradiando-me as mãos. (...) A 'visão astral' está muito imperfeita. (...)

               "É que tudo isto não é o vulgar desenvolvimento de qualidades de médium. Já sei o bastante das ciências ocultas para reconhecer que estão sendo acordados em mim os sentidos chamados superiores para um fim qualquer que o Mestre desconhecido, que assim me vai iniciando, ao impor-me essa existência superior, me vai dar um sofrimento muito maior do que até aqui tenho tido, e aquele desgosto profundo que vem com a aquisição destas altas faculdades é acompanhado duma misteriosa sensação de isolamento e de abandono que enche de amargura até ao fundo da alma. (...) Não sei se realmente julgará que estou doido. Creio que não. Estas cousas são anormais sim, mas não anti-naturais." (...)

               Comenta o biógrafo João Gaspar Simões: "É certo que, se a fase espírita parece ter sido passageira - embora em setembro desse ano ainda confie a Cortes Rodrigues  que continua a ser vítima de "fenômenos de mediunidade' -, já o mesmo não pode dizer-se da fase ocultista. Realmente o estudo da astrologia, com tudo o mais que se prende com as ciências ocultas, se já nessa altura parece familiar ao poeta da Mensagem, ir-se-á acentuando dái para o futuro."

                Segundo João Gaspar Simões, Fernando Pessoa inclinou-se para os problemas transcendetes, após o derrame de sua mãe, em 1916: "Então se voltara para o espiritismo, primeiro estádio da revolução 'religiosa' que se ia operar na sua consciência. Mas a revolução não terminara ainda. O espiritismo levara-o à teosofia e da teosofia passara ao ocultismo, forma derradeira da iniciação esotérica a que se entregara." De certo modo, era "a intuição do mistério" que desde a adolescência inquietava o poeta.

Fernando Pessoa, Poeta do Mistério

João Alves das Neves
 
...Creio na existência de mundos superiores ao nosso e de habitantes desses mundos, em diversos graus de espiritualidade, subutilizando-se até se chegara um Ente Supremo, que presumivelmente criou este mundo. Pode ser que haja outros Entes, igualmente supremos, que hajam criado outros universos, e que esses universos coexistam com o nosso, interpenetradamente ou não...

                Assim explicava Fernando Pessoa - O Poeta do Mistério - o que entendia por Ocultismo, em carta de 14 de Janeiro de 1935 a Adolfo Casais Monteiro. Trata-se da curiosíssima carta sobre a gênese dos heterônimos (à qual outra se seguiu), mensagem que se situa muito para além da heteronímia.
               
               Tudo parece simples a partir do Credo na existência dos mundos superiores. No entanto, há que entender, desde já, à definição de vários passos ocultistas do poeta da Mensagem, considerando que são múltiplos os degraus que transmitem as mensagens. Não-espírita. Não-maçônico. Não simplesmente astrólogo. Não apenas Rosa-Cruz. Não. Tudo isso e muito mais. Desde sempre no percurso de 13 de junho de 1888 a 30 de novembro de 1935.
               
                Num estranhíssimo livro, A invasão dos Judeus, impresso em Lisboa no mês de Janeiro de 1935, o amigo do Poeta, Mário Saa (não confundir com Mário de Sá-Carneiro), biografou em cerca de 4 páginas o inventor dos heterônimos, começando por apontá-lo como "futurista e judeu", lembrando que o seu quinto avô, Sancho Pessoa, fôra "astrólogo, ocultista e psalmista" e que, preso pela Inquisição, esse antepassado tinha sido "condenado a confisco, por judeu militante, em 1706". Do lado paterno, não há que negar as origens, embora o Pai do Poeta não seguisse o culto judaico, enquanto a Mãe pertencia aos chamados cristãos-velhos, o que explicaria ter dado ao filho o nome de Fernando Antonio, em homenagem ao Santo Antonio de Lisboa (que morreu em Pádua), já que o santo e doutor da Igreja foi Fernando na vida laica a Antonio na religiosa.


                De qualquer modo, a biografia de Mário Saa contém curiosas informações, não somente por se tratar de provável primeira informação "ocultista" sobre o Poeta, mas também por haver sido redigida por um amigo que o conhecia bem de perto e publicada em vida do escritor plural. Traçando o perfil de Fernando Pessoa, dizia Mário Saa: "Nós o vemos fisionomicamente hebreu, com tendências astrológicas e ocultistas. (...) Lança-se e oculta-se; esconde-se e prepara novos lances; é um verdadeiro furta-fogo! Tudo isto se revela pelos seus numerosos pseudônimos - pelos que tem, e pelos que há de vir a ter, e... pelos que não se sabe que tem!..."


                 Prossegue o biógrafo com outros esclarecimentos que revelam estar bem ao par de certos mistérios do criador da heteronímia: "Além do seu verdadeiro nome, Fernando Pessoa, é ele Álvaro de Campos, (autor dum ultimatum que começa assim: 'Mandado de despejo aos mandarins da Europa! Fora!), Alberto Caeiro, Ricardo Reis, etc. Isto só, verdadeiramente podia lembrar a um indivíduo duma raça oculta, tal a judaica ou a chinesa, que são as que mais contribuem para as associações secretas, para a franco-maçonaria, por exemplo; são chamadas as raças femininas, por excelência. Ora esta multiplicidade de pseudônimos, a que ele chama multiplicidade de personalidades, é apenas, a mesma personalidade em diversas temperaturas". Etc. Etc.


                 Mário Saa, que foi poeta e ensaísta, tendo deixado largos traços nalguns caminhos ocultistas, analisa outros aspectos da obra pessoana então em florescimento por várias publicações literárias e cita a respeito Guillaume Apollinaire, assinalando que no francês e no português se encontram "bons exemplos de literatura idiche", admitindo, a propósito de Pessoa: "Contudo, ele assevera que, apesar de descendente de judeus, ele, individualmente, o não é!". Por fim, considera: "Fernando Pessoa, um dos poetas maiores da sua raça, é um inventivo e um expressionista analítico."